Amigos
Quando iniciei neste universo do Bonsai em 1996 eu não tinha noção do que me aguardava, eu imaginava que aprenderia simplesmente a cultivar umas pequenas árvores em pequenos vasinhos e só, mas a medida que o tempo se passava fui descobrindo que não era fácil como eu imaginava e não era só a respeito de cultivar pequenas árvores.
O Bonsai me abriu sim um universo que fala muito sobre cuidados no cultivo de árvores, mas sobretudo o que o Bonsai me trouxe foram pessoas, pessoas que também compartilhavam da mesma ilusão de que o Bonsai seria nada mais do que aprender a cultivar árvores em bandejas, e sem perceber essas pessoas que se dispuseram em nos acompanhar nesta incrível jornada foram aos poucos se transformando em amigos, companheiros que no início compartilhavam apenas conhecimentos técnicos a respeito das tais arvorezinhas, mas que ao passar dos anos passaram a compartilhar outros aspectos da vida, é engraçado esse processo, no decorrer do tempo o Bonsai foi se tornando em não mais o principal objetivo mas em uma espécie de amalgama unindo as pessoas, fazendo com que aos poucos essa união se transformasse em uma amizade sólida e verdadeira e aí começamos a nos dar conta de que a medida que moldávamos nossas árvores elas também nos moldavam de volta e sem que percebêssemos elas iam nos transformando também, e a amizade ia se consolidando e entremeando todos os aspectos dessas vidas.
Dentre essas amizades vou destacar duas, não porque sejam as mais “importantes”, mas porque foram dois amigos que completaram suas jornadas antes de nós e se foram.
Quando iniciei conheci o senhor Ari Francisco que logo se transformou em amigo mais velho, irmão mais velho e porque não dizer uma espécie de pai também, estivemos juntos em tantas ocasiões gratificantes, viagens, eventos , visitas a amigos bonsaistas , enfim sempre com o bonsai nos acompanhando, apreendendo e compartilhando juntos e não só aspectos do cultivo de Bonsai mas de tudo o que se aprende, problemas, vitórias, derrotas, enfim vida, então em 2016 se foi vitimado de problemas hepáticos graves, deixando em nós muita saudade, eram manhãs de sábado que nosso companheiro sempre batia a porta de casa, tomávamos um café, proseávamos, ríamos e sempre com alguma árvore a mão recebendo cuidados, e assim nossas conversas fluíam e prazerosamente a manhã se ia, e como um instante breve e valioso já era hora de se despedir para tudo se repetir no sábado seguinte, as manhãs de sábado não contam mais com a sua presença mas elas ainda existem e vão existir assim até que nossa jornada possa um dia se cruzar novamente. O outro amigo a que me refiro, Evandro Floriano, mais conhecido como Vandão ou “monge”, nossa amizade foi com certeza genuína, meu irmão Vandão, sim ele era meu irmão, não de sangue mas de espírito com certeza, sua vida foi cheia de altos e baixos, assim como todas as nossas existências, a diferença é que estávamos juntos, Vandão se juntou a nós um pouco depois e trouxe aquela alegria verdadeira que se sentia só de estar na presença dele, mesmo as vezes enfrentando muitos desafios sempre foi o Vandão que tinha uma palavra de ajuda e de otimismo e eu sempre tentei retribuir na mesma moeda, não sei se consegui lhe trazer o mesmo, mas tenho certeza que fiz o meu melhor, e sempre, como eu já disse com o Bonsai fazendo o papel de “motivo” para que a amizade de desenrolasse nos presenteando com tudo que amigos verdadeiros sempre nos trazem, e meu grande, também literalmente falando, irmão Vandão também se foi, a pandemia o alcançou em março de 2021, e não lhe deu trégua até que ele partisse, mas fica a saudade boa, lembranças boas que sempre vão nos remeter ao passado não com tristeza ou amargura mas com muita leveza e felicidade de ter tido o privilégio de ter tidos amigos tão verdadeiros como esses.
E que fique a lição de que não vale a pena guardar mágoas ou rancores de quem quer que seja , queiramos ou não, acreditemos ou não a vida é uma jornada comum a todos nós, estamos aqui no mesmo barco, vamos cultivar Bonsai mas acima de tudo vamos cultivar amor e amizades, porque quando nossas jornadas aqui chegaram ao fim, apenas isso terá sido importante, o resto, inclusive os nossos queridos Bonsai, ficarão aqui, meditemos sobre tudo isso para dar importância ao que realmente deve ter importância.
João Porto
16 de abril de 2021
